Em Buenos Aires

terça-feira, 8 de junho de 2010

Realidade Mulher


Outro dia o César chegou em casa com um mimo pra mim. Uma reimpressão da Revista Realidade publicada em 1967 sobre “A mulher brasileira”. Pra quem não sabe, a revista era assim mesmo, cada edição tratava de um tema específico.

Adorei o agrado, mais até do que ele tinha pensado. Devorei a revista, sem conseguir parar de ler. (Parando, claro, quando o Tomás solicitava).

A edição faz inveja a muita publicação atual e trata a temática feminina com mais clareza e menos preconceito do que grande parte das matérias que lemos e assistimos no dia 8 de março.

De qualquer maneira, a minha idéia não é teorizar sobre a forma como a questão é tratada ou as opiniões são apresentadas, mas apenas dividir alguns aspectos que considero interessantes.

A revista em questão foi censurada por “ser ofensiva à dignidade e à honra da mulher” e ficou somente poucas horas nas bancas. A principal causadora da proibição foi uma reportagem sobre parto normal.

A publicação trata ainda da superioridade da mulher e do corpo feminina. E apresenta testemunhos como “Eu me orgulho de ser mãe solteira” ou “Confissões de uma moça livre”.

A mãe solteira tem orgulho, mas não coragem de mostrar o rosto. Ela quer preservar a filha. A moça livre em questão é a atriz Itala Nandi. Na entrevista ousada, ela descreve e critica padrões morais existentes.

Segundo ela, “a única liberdade de que goza a mulher brasileira é escutar o homem, curvando a cabeça. Ela não participa de nada, não sabe de nada. E não porque não quer, mas porque não pode.”

Em outro trecho, menciona um diálogo com a mãe sobre uma possível gravidez: “Minha filha, que vergonha, que humilhação: imagine em Caxias do Sul, os amigos do seu pai, as suas amigas, receberem a notícia de que você teve um filho com um homem que não é seu marido?“.

Mas o ponto alto da edição é uma pesquisa realizada pelo Inese (instituto de pesquisa da época) com 1.200 mulheres.

Algumas perguntas e respostas continuam atuais. Outras se tornaram inconcebíveis. Por exemplo: “A senhora admite ter relações de amizade com pessoas desquitadas?”, “Acha justo casar sem amor só para reparar o mal?” ou “Uma mulher decente pode gostar de sexo?’’.

Um dado alarmante ou no mínimo curioso da pesquisa é o de que uma em cada quatro mulheres respondeu já ter provocado um aborto. Consequência talvez do preconceito contra as mães solteiras e do ainda pequeno uso de métodos anticoncepcionais. Segundo a pesquisa, caso a igreja permitisse, o número de mulheres que tomam pílulas dobraria.

Se algumas respostas são conservadoras, outras nem tanto. A grande maioria admite o aborto, como já mencionado, não considera a prostituição um crime e gostaria sim de ter estudado mais.

Não custa dizer que todos os jornalistas da revista eram homens. E que não dá pra invejar em nada a vida das nossas avós.

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